22 de novembro de 2012

Os maus rebentos

    Qualquer um que o observasse pensaria que ele era nada prodigioso. E estaria certo. Nenhuma de suas feições indicava a perspicácia de que tão poucos são dotados. Nunca aparentava compenetrado, mas sempre como uma TV sem sintonia. Era estática. Era um mistério.
    Quando pequeno, vivia recluso. Quando instigado a falar, era irritante. Comunicava-se com gritos e choros, purgando os ouvidos dos familiares, que acabaram aprendendo a não incomodá-lo, para se absterem da situação periclitante.
    - Esse garoto é louco - dizia o tio. Despertava o tácito assentimento da tia e a animosidade dos pais.
    - Louca é sua mãe - dizia a progenitora, e colhia olhares ominosos do marido e do tio. Todos se calavam. O garoto gritava de algum cômodo da casa: - Louca é sua mãe! Os risos enchiam a cozinha. Não agradavam a sogra, é claro, que se punha a chorar e gritar, expondo toda sua cólera, justificada pela infância sofrida.
    - Nunca me compreenderam - bravava e arfava com o rosto bonachão, vermelho e molhado.
    Ninguém percebeu a entrada do garoto enquanto tentavam abrandar a desajeitada pilhéria. Ele tomou a vó pela mão e a levou para o jardim. Sentaram-se e conversaram como nunca outro familiar havia presenciado. O estarrecimento fumegava juntamente com as panelas do almoço, e, de queixo caído, todos aproveitaram a recente paz do fagueiro domingo em família.

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